quinta-feira, 30 de julho de 2009

A História Oral - Fatos de 1924.

A História Oral - Fatos de 1924.

”Revista da Semana”, um dos veículos que cobriu
o conflito no momento.
Saques em 1924
Revista da Semana - fuga da população
Êxodo da população duarante o conflito:
não de só meu avô.
Revista da Semana - bombardeio
Incêndios na cidade.

Existem histórias que podem ser contadas como sempre se fez desde o início da humanidade: histórias que foram ouvidas e repassadas à frente sem que nenhum escrito mais “confiável” tenha sido pesquisado, sem que nenhum dado oficial tenha sido catado, mais na confiança da idoneidade dos que contaram, e muito mais fielmente ao modo inicial da construção de nossa memória (desde tempos imemoriais). Quando criança, ouvi diversas vezes de minha mãe uma história que ela não sabia se era fruto de um devaneio infantil ou de imaginação demais: dizia que morava no bairro do Tatuapé (cidade de São Paulo), que deveria ter uns 3, 4 ou 5 anos quando bombas começaram a passar por cima de sua casa (“uma revolução, dizia”) de maneira tão perigosa e constante que seu pai (meu avô, portanto) agarrando poucas coisinhas, filhos e esposa se mandou para um refúgio longe de um “conflito inimaginável no nosso país” (pensava eu, cada vez que ela contava o caso). O refúgio oferecido e aceito ficava na distante Santo Amaro (uma cidade ainda, então, antes de virar um bairro “quase central” da capital paulista), num convento de freiras francesas. O que realmente sempre me instigou nesse relato repetido algumas vezes era sob qual conflito teria ocorrido tal situação.

Calculava épocas e o tempo que minha mãe morou no Brasil antes da volta de avô e cia para o Líbano (vale lembrar que o pai de minha mãe veio ao Brasil numa das primeiras levas de imigrantes libaneses, que aportaram em grande quantidade, bem no início mesmo do século XX, na Bahia, Ilhéus, por conta do progresso local relacionado ao cacau. Vale lembrar que os dois irmãos mais velhos de minha mãe nasceram na Bahia mesmo, e que ela e mais uma irmã um pouco mais nova nasceram em São Paulo) - quando ela deveria estar com uns 6 anos de idade -, e cheguei à conclusão que tudo realmente foi fato verídico durante a revolução de 1924, quando ela estava com 3 anos.

Fato histórico real: chamada de “Revolta Paulista” ou “Revolução Esquecida”, ou ainda de “Revolução do Isidoro”, foi a segunda revolta tenentista ocorrida nos anos 1920 – sendo que a primeira e mais famosa foi a “Revolta dos 18 do Forte de Copacabana” (1922) -, geradas por jovens oficiais do exército contra o voto de cabresto e a favor do voto secreto. Alguns nomes que ouvimos hoje por aqui – alguns como designação de ruas, avenidas ou praças – surgiram nesse conflito: Isidoro Dias Lopes foi um superior que comandou os jovens militares insubordinados ao governo central, entre eles, Joaquim Távora e Índio do Brasil. As bombas que passavam por sobre o bairro do Tatuapé – zona leste da cidade – tinham origem nas tropas federais que, vindas da capital do país, o Rio de Janeiro, então, se aquartelaram no bairro da Penha (bairro vizinho do outro), como o primeiro ponto urbano onde desembocava o caminho do Rio; tais bombas tinham como destino o quartel central da Luz (Quartel da Força Pública), a sede do governo, no vizinho bairro dos Campos Elíseos, e os baiiros operários da Zona Leste (Belém, Brás Moóca).

A curiosidade que me causava um relato de bombas - vindo da boca de minha mãe, em plena cidade de São Paulo -, depois de apaziguada pelas pesquisas e cálculos que fiz, ganhou cara de espanto total quando das minhas visitas (já em época de faculdade) à casa de um vizinho (“seo” Domingos Cipullo) que veio a tornar-se meu guru intelectual. As tardes regadas a café e com bolo de fubá na casa dele e de suas irmãs renderiam muitas histórias pitorescas (talvez volte a elas), mas o espanto que cito acima – relacionado também a 1924 – surgiu quando soube, por ele, da existência de um pequeno zoológico (talvez o primeiro da cidade) incrustado dentro do parque da Luz (portanto, vizinho do quartel central e da sede do governo paulista): pois bem, durante os bombardeios, parque abandonado, os bichos fugiram de suas jaulas (bombardeadas?) e viraram alimento dos vizinhos. Segundo meu velho guru caipira (“seo” Domingos nasceu na ex-cidade de Pirambóia – região da Sorocabana paulista), nenhum foi recuperado (com certeza não tinham elefantes e leões, pois não?): a cidade ainda mantinha hábitos caipiras, e qualquer coisa que se movesse ou respirasse virava comida.

Bombas sobre casas, animais comidos impiedosamente, fatos de pouco reconhecimento atual. Conto sobre eles como história oral, mas bastante crível. Sobre a revolução, vi que tem muita coisa

aqui na internet. Curiosidade: até hoje existe numa praça, perto da avenida Tiradentes, bem próximo ao quartel do exército e do Parque da Luz, uma Torre-Chaminé de tijolos (projetada por Ramos de Azevedo) com marcas de tiros de canhão, preservada como lembrança de então.
Cartaz ufanista com imagem de Isidoro Dias Lopes,
sobre a bandeira de São Paulo.
”Torre-Chaminé” - com as marcas das balas - que
existe até hoje como lembrança.
Mapa da Cidade em época próxima do ocorrido
Obs: as quatro primeiras fotos foram obtidas da “Revista da Semana” (agosto de 1924).

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