quarta-feira, 2 de setembro de 2009

CEL. PAES DE LIRA, fale sobre sua experiência e carreira profissional.

Em entrevista exclusiva ao “Direito de Escolha”, o Coronel da Reserva PAES DE LIRA fala sobre sua carreira profissional e sobre as diversas lutas que ajudou a travar para sustentar o direito à Legítima Defesa e à proteção da vida dos policiais no Brasil. Confira!

DIREITO DE ESCOLHA: CEL. PAES DE LIRA, fale sobre sua experiência e carreira profissional.

CEL. PAES DE LIRA: Sou paulistano, nascido em 30 de março de 1953, de pais pernambucanos. Meu pai era Praça da Força Pública (atual Polícia Militar do Estado de São Paulo): família humilde, de quatro filhos, que ele e minha mãe forjaram no respeito aos valores de Deus, Família e Pátria e orientaram no caminho da busca de objetivos dignos, com base no estudo e no trabalho. Estudei em escolas públicas da Capital e de Jundiaí. Aos 16 anos, prestei o vestibular da Academia Militar do Barro Branco, escola superior responsável pela formação dos Oficiais da Instituição, e nela ingressei em 1970. Diplomei-me em 1974 (Turma Cidade de São Paulo). Galguei os postos da carreira até o topo e tive a honra de servir à população paulista durante 35 anos na Ativa. Passei para a Reserva, no posto de Coronel, em dezembro de 2004: a isso fui compelido, com apenas 51 anos de idade e na plenitude doconhecimento profissional, pela imprópria lei ainda vigente em nosso Estado, embora desejasse permanecer no serviço ativo. Exerci o cargo de Corregedor-Adjunto da Corporação e fui Comandante do 3º Batalhão de Choque Humaitá, da Academia Militar do Barro Branco e da Área Metropolitana Norte da Capital. Meu último, e mais importante, cargo (terceiro na hierarquia da Corporação) foi o de Comandante do Policiamento Metropolitano, responsável pela ordem pública em toda a Região Metropolitana da Capital, com dez mil policiais militares sob minhas ordens.

Fui condecorado 25 vezes e tenho em minha fé de ofício 60 elogios individuais das autoridades superiores por destacadas ações e operações de segurança e de ordem pública que planejei, executei e comandei durante a carreira. Fui primeiro colocado em ambos os Cursos de Pós-Graduação da Polícia Militar, respectivamente em nível de mestrado (Aperfeiçoamento de Oficiais) e de doutorado (Superior de Polícia). Tive diversas experiências de intercâmbio de conhecimentos policiais no exterior, nos Estados Unidos, no Chile, na Holanda e em El Salvador. Foram-me confiadas outras missões oficiais, de caráter operacional, na Colômbia, no Canadá, no Iraque, na Arábia Saudita, na Itália e na França. Sou instrutor certificado do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) na área de Emprego da Força Policial sob a Égide dos Direitos Humanos. Na vida civil, diplomei-me em Administração de Empresas pela Universidade Mackenzie.
Após passar para a Reserva, engajei-me na campanha do referendo de 2005, tendo sido uma das reconhecidas lideranças na luta pela preservação das pessoas de bem à legítima defesa. Esse reconhecimento estendeu-se para o plano cosmopolita, o que me levou à Alemanha, aos Estados Unidos e à Organização das Nações Unidas para relatar a experiência brasileira e falar sobre os impactos dela no futuro das demais nações, no tocante ao direito das pessoas de bem à posse mansa e pacífica de armas de fogo legais para defesa pessoal e familiar. A convite do CICV, também estive no Peru, onde participei do Encontro Internacional de Instrutores da entidade e proferi palestra para a Polícia Nacional daquele país.
Determinado a prosseguir na vida pública, com uma plataforma baseada no já mencionado direito das pessoas de bem e em temas de segurança pública, concorri em 2006 a uma cadeira na Câmara Federal. Fui declarado eleito, mas uma “retotalização” posterior de votos afetou a segunda vaga obtida por meu partido e retirou-ma da lista de eleitos. Atualmente, figuro como primeiro suplente do Partido Trabalhista Cristão por São Paulo e travo uma batalha judicial para reformar a decisão da Justiça Eleitoral, que considero inconstitucional e ilegal. Como costumo dizer: nenhuma novidade, apenas continua marcada pela luta uma vida que sempre foi de lutas.


DIREITO DE ESCOLHA: A campanha do desarmamento no Brasil, que em sua primeira fase estimulou a entrega de armas de fogo pelos cidadão comuns para destruição pelo Governo, acabou fracassando no Referendo de 2005, quando os Brasileiros votaram a favor do comércio de armas de fogo e munição no País. Como o sr viu este processo?

CEL. PAES DE LIRA: Estou engajado nessa luta cívica desde 1999, quando, ainda Tenente-Coronel da Ativa, portanto sujeito a graves riscos profissionais, concedi uma entrevista à revista Catolicismo, publicada com o título “Desarmamento: perigo para a Nação”. Minha motivação foi uma só: combater por algo em que sempre acreditei — o direito constitucional à legítima defesa — e opor-me ao mal disfarçado projeto totalitário que, para mim, desde aquela época, ficou claro existir no bojo do projeto de lei que então tramitava no Congresso Nacional, por iniciativa dos mesmos parlamentares que encabeçaram a campanha proibicionista e foram vencedores em obter a lei 10.826, extremamente restritiva, mas derrotados pelo voto popular na tentativa de impor a proibição absoluta de comércio civil de armas de fogo e munição. Ao tornar-se pública a mencionada entrevista, muitos afirmaram que, ao assumir abertamente posição contrária ao poder vigente e ao “politicamente correto”, eu assinara a sentença de morte de minha própria carreira. Isso não se concretizou, mas sofri pressões veladas para silenciar, coisa que me recusei a fazer.

O que explica tão esmagadora vitória foi, em uma palavra, a mobilização das forças contrárias à proibição, portanto favoráveis à preservação do direito à legítima defesa por meio de armas de fogo. Sempre afirmei que as pré-pesquisas refletiam apenas o massacre de mídia patrocinado pelo Governo Central e, por conseguinte, poderíamos virar o jogo a partir do momento em que dispuséssemos de espaço para o convencimento maciço da população. Tal espaço teve quatro vertentes, a saber, por ordem crescente de importância: os eventos públicos (debates e palestras ao vivo); a Internet; a cobertura de mídia (entrevistas e debates por rádio, TV e pela imprensa escrita, nesta última incluindo-se a franca tomada de posição editorial pela revista Veja); e o horário gratuito da legislação eleitoral. As três primeiras funcionaram e deram frutos exclusivamente pela ação da militância antiproibição. A última, derivada diretamente da legislação, deu frutos pelo trabalho da Frente Parlamentar, lastreado no da equipe de produção, devendo-se frisar, não obstante, que isso aconteceu porque nós, a militância engajada na luta há dez anos ou mais, convencemos, com alguma dificuldade, os parlamentares e marqueteiros a enfocar na campanha o tema do direito constitucional à legítima defesa, abandonando a tentação de navegar no lema flexível, e por isso mesmo concessivo, “Desarmamento: seria bom se fosse verdade”. Esta linha pareceu-nos, desde o começo, algo como aceitar o desafio do inimigo no campo e nos termos escolhidos por ele, pois, de fato, o referendo não se referia ao desarmamento, já praticamente imposto pelo grosso da lei 10.826/2003, mas à proibição total do comércio a civis, que, se aprovada, iria muito mais longe e sepultaria, peremptória e absolutamente, o direito dos cidadãos de bem que se julgassem aptos a agir em defesa própria e de sua família, se necessário por meio de armas de fogo legais. Essa maciça mobilização conseguiu o convencimento da maioria, com base em uma mensagem simples e verdadeira: a de que estava em jogo um direito que não se poderia atirar na lata de lixo, em prejuízo não somente da atual geração, mas das futuras gerações. Nossa mensagem foi levada ao povo sem truques ou artifícios. Todos os que se empenharam em levá-la ao eleitorado fizeram-no de modo sincero, direto e baseado em argumentos verificáveis e bem esgrimidos, que acabaram suplantando as mentiras repetidas à exaustão, as afirmativas meramente emocionais e as falas de palminhos de caras bonitos, mas sem profundidade intelectual ou espiritual, que as pessoas acostumaram-se a ver nas novelas que fomentam exatamente a violência, a demolição da família e de todos os valores cristãos, especialmente a defesa da vida, que a claque da rendição afirmava ser sua bandeira. O papel da Internet foi decisivo: em termos de campanhas político-eleitorais (pois o referendo foi exatamente isto) é possível afirmar que, pela primeira vez no Brasil, a mobilização via Web foi tão decisiva. E mais: o efeito do convencimento não foi apenas o de obter votos das pessoas atingidas pelas mensagens, mas o de fazer delas multiplicadoras de opinião. Assim, o País assistiu a uma onda de convencimento interpessoal, nos lares e nos locais de trabalho como nunca antes se vira. Somente a exponencialidade de um fenômeno político como o descrito é capaz de explicar como se realizou uma inversão de expectativas de tal amplitude.

DIREITO DE ESCOLHA: Sabe-se que muitas das armas entregues pelos cidadãos foram encontradas nas mãos de bandidos posteriormente. Essas armas não deveriam ter sido destruidas?

CEL PAES DE LIRA: Isso realmente aconteceu. Para ilustrar, basta mencionar o trecho abaixo, de uma notícia do Diário de São Paulo, edição de 09/09/2005 (também publicada n’O Globo e no “site” Terra):“Oitenta e três armas entregues à Campanha do Desarmamento e encaminhadas à Polícia Federal no Estado de São Paulo foram desviadas e escaparam da destruição. Nos últimos meses, pelo menos 11 delas foram apreendidas por policiais militares do 6º Batalhão do Interior (Santos) nas mãos de menores, assaltantes e traficantes. As armas desviadas são revólveres e pistolas entregues no período de julho de 2004 a maio de 2005. A PF instaurou inquérito para apurar os desvios de armas.”
De fato, a lei já então vigente determinava o envio de todas as armas apreendidas, ou entregues pela população, ao Exército para destruição. A permanência indevida delas em repartições da Polícia Federal, sem adequada guarda, deu margem a que policiais corruptos tirassem proveito da situação, desviando um bom número delas, certamente mediante paga, às mãos do crime organizado. Como afirmei naquela ocasião, a lacrimosa campanha do desarmamento atingiu, então, um belo resultado: obter sua própria desmoralização.

DIREITO DE ESCOLHA: Bem, a partir da vitória do “NÃO”, hoje é possível que o cidadão comum tenha uma arma de defesa, registrada junto à Polícia Federal. Mas como funciona na prática o processo para aquisição e porte de arma pelos civis? O que é exigido do cidadão e quais são as maiores dificuldades para se portar uma arma de defesa na legalidade?

CEL PAES DE LIRA: O famigerado Estatuto do Desarmamento (lei nº 10.826/2003), mesmo sem o artigo 35, demolido no Referendo de 2005, continua a ser imposição legal draconiana. O texto dele declara os direitos à posse e ao porte de armas de fogo de uso permitido pelos brasileiros, sob certas condições, mas é extremamente difícil realizar, na prática, tais direitos. Para mera posse de arma de fogo em domicílio (que não autoriza portá-la nas vias e áreas públicas), a pessoa terá de provar: ausência de antecedentes criminais de qualquer ordem, residência fixa, emprego, habilitação técnica e aptidão psicológica. Terá, ademais, de pagar as taxas pertinentes: de exame psicológico, sempre caro; de prova técnica, sempre cara; e de registro, que terá de ser renovado a cada três anos (era de R$ 300,00 até há pouco, tendo sido reduzida a R$ 60,00 pela Medida Provisória nº 379/2007). Mas isso não é tudo: terá de declarar uma tal “efetiva necessidade”, termo jurídico colocado na lei de forma deliberadamente vaga, de modo a oferecer aos funcionários da Polícia Federal ampla discricionariedade na decisão de conceder, ou não, a autorização de compra, que antecede o registro. No tocante ao porte, então, tudo é muito pior, pois, além do cumprimento das mesmas exigências burocráticas, a taxa sobe ao absurdo valor de R$ 1.000,00 (também exigível a cada três anos!) e, ademais, o interessado deverá provar (não apenas declarar “efetiva necessidade”, necessariamente ligada a ameaça de morte ou exercício de profissão de risco. A obtenção da autorização de porte, nessas condições, resulta praticamente impossível, a tal ponto que, num universo reconhecido de aproximadamente três milhões de armas de fogo devidamente registradas, existem no País apenas pouco mais de três mil autorizações expedidas.

DIREITO DE ESCOLHA: Os textos iniciais do Estatuto do Desarmamento indicavam também o desarmamento dos policiais no Brasil. É isso mesmo?

CEL. PAES DE LIRA: O anteprojeto dessa lei, gestado por Raul Jungmann, Renan Calheiros e Luiz Eduardo Greenhalg, entre outros, ia muito longe: simplesmente acabava com o direito à legítima defesa por meio de armas de fogo e proibia completamente a comercialização de armas e munição no Brasil. A proibição de adquirir armas particulares atingiria também os militares, policiais e outras categorias profissionais que tinham, por disposição estatutária, o direito de ter e de portar armas (por exemplo, juízes de Direito e membros do Ministério Público). Aqueles radicais do absurdo não conseguiram um texto assim peremptório, mas, em hábil e astuta manobra, conseguiram dos demais parlamentares a inclusão do artigo 35, que determinava a proibição de comercialização, condicionada à aprovação em referendo popular, a realizar-se em outubro de 2005. Os estrategistas da matança do Direito imaginavam, com base nas pesquisas de opinião de que então dispunham, que o referendo seria apenas um “show” político, pois estava ganho de antemão. Para usar uma expressão popular, “quebraram a cara”. Mas, se tivesem vencido, teriam, de todo modo, conseguido desarmar os policiais. Vejam o texto abaixo (na íntegra, entre aspas), de uma mensagem que fiz circular, em 17/10/2005, pela Internet e por outros meios de comunicação:“ALERTA AOS MILITARES E POLICIAIS: A PROIBIÇÃO VAI DESARMAR-NOS TAMBÉM - Cel Jairo PAES DE LIRA

A desfaçatez da propaganda da Frente da Rendição, veiculada no horário eleitoral gratuito de rádio e de televisão, leva-me a escrever este texto para alertar os ilustres militares e policiais que, como eu, dedicam ou dedicaram suas vidas à defesa da Pátria e à proteção das pessoas de bem. A claque desarmamentista, associada, para desgraça das Instituições, a alguns superiores que só sabem baixar a cabeça e fazer o que o governo manda, quer convencer de que a proibição não afetará os militares e policiais. Afirmam que eles poderão continuar a comprar armas de fogo e munição, do mesmo modo como hoje acontece, pois a isso supostamente têm direito pelo Estatuto do Desarmamento, ainda que passe a proibição.
Grossa e deslavada mentira!

O que o eleitor brasileiro vai decidir, em 23 de outubro de 2005, é se porá, ou não, em vigor um único artigo (o de nº 35) da lei 10.826, de 22/12/2003, conhecida como Estatuto do Desarmamento. O efeito do “sim” será fazê-lo valer. O efeito do NÃO será mandá-lo para a lata de lixo da História, seu merecido destino. Peço sua atenção para o texto da lei:
“Art. 35. É proibida a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, salvo para as entidades previstas no art. 6o desta Lei.
§ 1o Este dispositivo, para entrar em vigor, dependerá de aprovação mediante referendo popular, a ser realizado em outubro de 2005.” (o grifo é meu).
Portanto, se vencer o “sim”, entrará em vigor, no dia seguinte ao do referendo, o artigo acima, cuja conseqüência é a proibição absoluta e geral de que os cidadãos brasileiros comprem armas de fogo ou munição, pois proibir a comercialização é o mesmo que impossibilitar aos consumidores a compra. Se é tão claro, em que se apóia a falácia da Frente da Rendição? Em uma “pegadinha” que insulta a nossa inteligência. Os marqueteiros do “sim” tentam enganar-nos afirmando que nos incluímos entre as entidades previstas no artigo 6º da lei, sendo, portanto, exceções à regra de proibição. Vejamos: “Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:
I – os integrantes das Forças Armadas;
II – os integrantes de órgãos referidos nos incisos do caput do art. 144 da Constituição Federal;
[...]
IX – para os integrantes das entidades de desporto legalmente constituídas, cujas atividades esportivas demandem o uso de armas de fogo, na forma do regulamento desta Lei, observando-se, no que couber, a legislação ambiental.” (grifos meus).Transcrevi apenas os incisos mais significativos, por simplificação. Lembro que integrantes das Forças Armadas são os militares da Marinha, do Exército e da Força Aérea, enquanto os integrantes dos órgãos constantes do artigo 144, caput, da Constituição da República são os militares estaduais e os policiais federais e estaduais.
Agora, examinem com atenção. Observem que a lei usa a palavra integrantes para definir as pessoas que compõem as organizações mencionadas no artigo 6º. E utiliza a palavra entidades para definir essas mesmas organizações. Isto fica a salvo de qualquer dúvida quando se põe sob exame a expressão contida no inciso IX, acima transcrito: “integrantes das entidades”. Fica manifesto que, no âmbito da lei 10.826, a palavra entidades refere-se a organizações, não a pessoas. Estas, os militares e policiais inclusive, são denominadas, na lei, de outro maneira (integrantes das entidades). Por corolário, ao dizer que a regra do artigo 35 tem exceção para entidades, a lei não estende tal exceção para pessoa alguma.
Em resumo, caros militares e policiais: se a proibição for aprovada, seremos desarmados.
É claro que os da Ativa poderão utilizar, de acordo com os regulamentos funcionais, as armas oficiais. Mas, se já não forem possuidores de uma arma particular de defesa, ao passarem para a inatividade, ou por motivo de restrição funcional, ficarão imediatamente sem condição de proteger, por seus próprios meios, seu lar e suas famílias. Essa perigosa situação é especialmente grave para os policiais.
É claro que os que já possuem arma particular poderão mantê-la. Mas não mais poderão comprar munição! Ora, não preciso dizer-lhes o que significa uma arma de fogo sem munição. Talvez venha a servir de simpático vaso (com um lírio branco de paz no cano fica bem bonitinha).
E não acreditem nessa balela de que poderemos comprar arma de fogo e munição diretamente da fábrica. A proibição, se passar, impedirá qualquer espécie de comercialização, seja via loja, seja diretamente da fábrica. Não aceitem orientações oriundas de alguns governos que, como sabemos, não nos conferem respeito algum. Lembrem-se da “consideração” com que são tratados, por exemplo, os militares federais e os policiais de São Paulo na questão salarial e tirem suas conclusões.
Para manter o seu direito constitucional de ter e de portar arma de fogo, em defesa de si e da família, só há um jeito: rejeitar a proibição.
Votem 1; votem NÃO!”

DIREITO DE ESCOLHA: Todos sabem que o crime organizado hoje no Brasil é cada vez mais profissional e que as facções têm acesso no mercado ilegal de armas a equipamentos de altíssima qualidade tecnológica e altamente letais. As polícias brasileiras estão preparadas para combater o crime organizado? Que tipos de armas e calibres são usados hoje pelas Polícias brasileiras? E pelo crime organizado? Poderia fazer uma comparação entre ambos em termos de poder de fogo?

CEL. PAES DE LIRA: No Brasil, à semelhança de outras nações ocidentais, as Forças Policiais são armadas. Sua dotação de armamento inclui revólveres, pistolas semi-automáticas, escopetas de repetição calibre 12, certo número de submetralhadoras e restrito número de fuzis de assalto (automáticos ou semi-automáticos). Na preservação da ordem pública a Polícia Militar, desde há alguns anos, vem utilizando intensivamente armas e munição subletais (projéteis de borracha, por exemplo). No entanto, mesmo a Polícia Militar, que tem missões constitucionais no âmbito da defesa da Pátria, como Força Auxiliar do Exército, não dispõe de lançadores de foguetes e raramente usa os poucos fuzis de sua dotação. Já os criminosos, especialmente os dos bandos organizados que infestam os morros do Rio de Janeiro, têm em seu poder e empregam à larga pistolas de grosso calibre, fuzis de assalto, metralhadores de alto poder de fogo, lançadores de foguetes e até minas terrestres antipessoal. Ou seja, dispõem do mesmo poder de fogo da infantaria de qualquer exército. Será que compram tal armamento em lojas? Claro que não. Desarmar os cidadãos de bem, especialmente os policiais, não passa, na melhor das hipóteses, de uma idéia demagógica, que, se posta em prática, só serviria para aumentar o poder dos criminosos e piorar a vulnerabilidade da população a eles.
Por outro lado, o combate ao crime organizado é muito mais uma questão de inteligência policial do que de poder de fogo. Somente a articulação, isenta de ciumeiras, de todos os organismos estatais voltados à defesa da lei e da ordem (Polícia, Judiciário, Ministério Público, Receita, Forças Armadas) será capaz de obter vitória total contra essa ameaça, que corrói as instituições e ameaça o futuro do País. Apenas para ter-se uma idéia de nossa deficiência estrutural, nem sequer temos um banco de dados nacional de antecedentes criminais verdadeiramente eficaz e acessível a todas as organizações policiais. Ademais, estamos a engatinhar no conhecimento de um dos principais mecanismos do crime organizado: a lavagem de dinheiro.
Não obstante, é irresponsável deixar de pensar essa questão sob a ótica da segurança pessoal dos policiais. Por uma razão muito simples: o crime organizado, ao sentir-se sob pressão do Estado, recorre quase sempre ao terror. Os episódios da história recente da ordem pública, especialmente em São Paulo e no Rio de Janeiro, foram ondas de terrorismo criminal. E elas expressaram-se, fundamentalmente, na matança seletiva de policiais e de agentes penitenciários, na maioria dos casos caçados e abatidos quando estavam nas ruas, de folga, ou defronte às suas próprias casas, ao chegar do trabalho, buscando o repouso e o convívio do lar. É nessas ocasiões agudas, ao desabrigo do apoio das instituições e dos colegas, que o policial necessita de uma arma de fogo potente, moderna e confiável. Ocorre que o Estado nem sempre a disponibiliza para uso fora de serviço. E até mesmo São Paulo, o Estado mais rico da Federação, depois de mais de dez anos de iniciado um plano de rearmamento dos policiais civis e militares, não conseguiu até agora fornecer a cada um deles uma pistola .40 de carga pessoal. Há policiais paulistas que ainda defendem a sociedade com velhos e pouco confiáveis revólveres calibre 38. Há policiais, em outras Unidades Federativas, que são obrigados a deixar as armas oficiais nos quartéis ao final do turno de serviço, simplesmente porque não há sequer velhos revólveres para todos.

DIREITO DE ESCOLHA: A portaria n. 812 determina que o policial brasileiro pode adquirir uma arma de defesa, desde que esta mesma arma seja fabricada no Brasil. Isso não caracteriza reserva de mercado? Qual a sua opinião sobre o assunto?

CEL. PAES DE LIRA: Essa restrição não existe para todas as armas, mas para a pistola .40, que figura na atual legislação como arma de uso restrito e, por essa razão, não era, até 2005, de aquisição permitida, salvo por instituições oficiais (nunca por pessoas físicas). A Portaria nº 812/2005, do Comando do Exército, baixada nos termos do artigo 27 da lei 10.826, representou um acerto, oferecendo uma resposta ao anseio dos policiais, em face do mencionado levante do crime organizado violento. Mas foi um acerto parcial, pois, provavelmente preocupado em preservar a indústria bélica nacional, o Exército editou a norma com a restrição mencionada na pergunta.
Sou favorável ao desenvolvimento de uma forte indústria bélica nacional, seja para a produção de material de patente própria, seja para produzir artefatos sob licença internacional. Tenho convicção de que o fracasso desse projeto, apesar do vigor que mostrou nos anos 70 do século passado, foi um desastre para o posicionamento estratégico do Brasil, frente à sua condição de potência emergente. No entanto, em meu entender, uma forte indústria bélica deve traduzir-se na capacidade técnica de produção de carros de combate, peças de artilharia, convencional ou por vetores teleguiados, petrechos pesados, armas automáticas de infantaria, belonaves (especialmente a propulsão nuclear) e aeronaves de combate e de bombardeio.
Não vejo escopetas, revólveres e pistolas como itens necessários a desenvolver — e a proteger, em termos de reserva de mercado — como parte do referido projeto nacional. Uma pistola .40 é, hoje, considerada de uso restrito pela normatização brasileira. Trata-se, no entanto, de mera convenção. Convenção coerente com o Estatuto do Desarmamento, sem dúvida, mas apenas porque tal lei padece de absurdo grau de restritividade. Não haveria problema algum, como demonstra a experiência de outras nações, em permitir seu uso até mesmo por civis habilitados. Mesmo sua utilização como arma individual de Oficiais de Infantaria, em combate, é restrita à defesa própria a curta distância, em engajamento corpo-a-corpo, ou prestes a assim tornar-se, naquelas clássicas situações em que o “staff sergeant”, ao ver o branco do olho do inimigo que fecha o cerco sobre seu PC, alerta o Estado-Maior: “gentlemen, prepare to defend yourselves!”.
Pistolas semi-automáticas não são, a rigor, armas de guerra, mas de defesa pessoal. A reserva de mercado para elas não se justifica. Ademais, o monopólio tende a provocar fenômenos de carência de qualidade. A ausência de competição freqüentemente acomoda o detentor do cartel, levando-o a prestar pouca atenção aos anseios dos usuários. Afinal, trata-se de uma clientela compulsória, sem alternativa, compelida a aceitar o que lhe seja oferecido: em suma, consumidores sem direito de escolha.
Claro que o presente debate seria inócuo caso a legislação brasileira proibisse de modo absoluto a importação de bens duráveis, entre os quais armas de fogo. Mas não tem sido esse o caminho trilhado pelo País, nos últimos anos. Existe importante grau de abertura comercial, diretamente derivado dos compromissos que o Brasil assumiu âmbito da Organização Mundial do Comércio, de que é importante membro. Em conseqüência, é permitida a importação de armas de fogo definidas pela legislação. Frente a essa realidade, estranha fica a restrição da Portaria 812. A competição comercial, em minha visão, seria boa para todos. Os militares, policiais, juízes de Direito e membros do MP (futuramente, quem sabe, o público civil) poderiam exercer seu juízo crítico de escolha e seriam beneficiados pela natural redução de preços. A indústria nacional, para manter-se no mercado, elevaria sensivelmente seu padrão de qualidade. As instituições públicas que adquirem armas de fogo ver-se-iam também como beneficiárias desse inevitável ganho de qualidade e da decorrente economia para o erário.

DIREITO DE ESCOLHA: Gostaria de acrescentar algo? Por favor fique à vontade.

CEL. PAES DE LIRA: violência, em todas as suas facetas, é um mal social. Também nós, que defendemos o direito à legítima defesa, compartilhamos do sonho de extirpá-lo totalmente, a ponto de atingir o ideal de uma cultura de paz. A diferença é que sabemos que ela está muito distante no tempo: é coisa para daqui a alguns séculos. No momento, e nas décadas que viverão nossos filhos e netos, a realidade é que a paz só pode ser assegurada por gente de bem, armada até os dentes: especialmente os bravos policiais que nos protegem. Suas armas são instrumentos de pacificação, de defesa da população e de si mesmos, de preservação da lei e da ordem. Combater o crime é investir nas forças que nos defendem. É aparelhar a Polícia, formar e treinar policiais em padrão de qualidade cada vez maior, e pagar-lhes salários dignos, não os de fome que são a regra em nossos Estados. Combater o crime é unir a Força Pública ao Povo de modo estreito e indissolúvel. Combater o crime é impedir a cooptação de nossa juventude pelo crime organizado, oferecendo aos jovens, por meio das políticas públicas adequadas, oportunidades reais no mercado de trabalho e na vida associativa. Combater o crime é acabar de vez com a legislação penal e processual penal leniente, que favorece a impunidade, reforçando o Ministério Público e o Poder Judiciário. Mas certamente não é impedir os policiais de possuírem e de portarem armas particulares de defesa, de sua escolha, que os habilitem ao menos a enfrentar, na eventualidade de uma emboscada, criminosos super-armados.
Os policiais, ainda que de folga, são frentes individuais de resistência ao crime. Dê-se a eles o justo direito de escolha. Haverá fatias de mercado para todos os fornecedores, nacionais ou não, desde que demonstrem capacidade e competência para suprir os agentes da lei com armas de porte modernas, robustas e confiáveis. É o mínimo que merecem como pessoas que, com risco de seu bem maior — a própria vida — defendem os direitos de todos os nossos concidadãos contra a sanha arrogante do crime.


http://www.direitodeescolha.com.br/entrevista.html

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