sexta-feira, 27 de agosto de 2010

O que é a Tradição? - por Julius Evola

Há duas razões pelo qual hoje é oportuno precisar o conceito de Tradição em sua acepção particular, pelo qual se converteu muito corrente usar tal termo com letra maiúscula.



A primeira razão é o interesse crescente que a ideia de Tradição como ponto de referência suscitou e continua suscitando nos ambientes de cultura e contestação de direita, em especial entre os pertencentes à nova geração.



A segunda razão se refere ao facto que, ao mesmo tempo, e se pode dizer que justamente por haver se constatado tal interesse, se formularam intentos de sustentar uma internegração caduca e tíbia do conceito de Tradição, quase para suplantar o originário e integral e substituí-lo com um conteúdo menos comprometido e mais acomodado, de modo tal de permitir a continuidade das routines de uma mentalidade em grande medida conformista. Se poderia falar, a tal respeito, usando um termo francês, de uma escamotage.



E é assim como aconteceu, por exemplo, o distanciamento de certas pessoas, que atraídas em um primeiro momento pelo conceito de Tradição, terminarão aderindo a um “tradicionalismo católico”(1). Acerca do sentido interno de tal distanciamento são bastante significativas as palavras expressadas por um escritor expoente desta direcção, em uma entrevista concedida por ele a Gianfranco de Turris. O escritor em questão reconheceu que da mesma maneira que outros de sua geração e das sucessivas, em um primeiro momento se interessou pela ideia tradicional, especialmente pelas suas aplicações políticas, mas logo distanciou-se sentindo que as coisas aconteciam como em uma “sã cura de helioterapia”, havia que “retirar-se do sol antes de ser queimado”.



Evidentemente este não é senão um modo elegante para dizer que não se suportava a força de certas ideias formuladas sem atenuações, daí então o distanciamento e a adesão ao “tradicionalismo católico”. Um caso importante é o constituído por um livro, editado por Bompinani que se intitula: “O que é a Tradição?” Aparte do facto de que não se trata de uma exposição sistemática, senão de um grupo de ensaios que muitas vezes tem pouco que ver com o tema, o autor dá novamente uma versão tíbia da Tradição, com visíveis preocupações de carácter religioso e moralizante, o alarde expressado através de citações múltiplas de uma cultura variada vale mais para confundir que para esclarecer, dada a falta de um rigoroso quadro sistemático. É bastante visível que este livro foi justamente escrito em relação ao mencionado crescente interesse pela ideia de Tradição. Há um aspecto que merece ser assinalado, o autor do livro em questão, que pretende dizer o que é ou que seria a Tradição, por certo não sonhou jamais de aproximar-se a tal ordem de ideias até não faz muito tempo quando andava junto com Moravia e com outros expoentes da intelectualidade esquerdista italiana. Ele ignora que o conceito integral de Tradição havia sido já formulado nos anos 20 por René Guénon(2) e seu grupo, e depois em nossa obra Revolta contra o Mundo Moderno, editada em 1934 na Itália e em 1935 na Alemanha, a primeira parte desta obra se intitula justamente “O mundo da Tradição”. O autor aludido cita apenas um par de vezes a contribuição da corrente guenoniana, entretanto ignora sistematicamente a nossa. Lamentavelmente ele dispõe de um círculo bastante vasto de leitores, pelo qual sua tíbia apresentação do que seria a Tradição resulta sumamente perniciosa.



O autor em questão se perde em uma discussão quase teológico-escolástica quando afirma que a “tradição por excelência é a transmissão do conhecimento do objecto óptimo e máximo, o conhecimento do ser perfeitíssimo”. Isto poderá valer no campo contemplativo-religioso, e só com referência ao mesmo se pode dizer que a Tradição “se concreta em um conjunto de meios: sacramentos, símbolos, ritos, definições discursivas cujo fim é o de desenvolver no homem aquela parte, faculdade, potência ou vocação, que lhe coloca em contacto com o máximo do ser que lhe seja consentido, colocando-o por cima de suas constituições corpórea ou psíquica, o espírito ou intuição intelectual”. Se nestes termos é reconhecida a definição de uma hierarquia “entre os seres relativos e históricos, fundada em seu grau de distanciamento a respeito da ideia do puro ser”, é evidente que aqui se fixa em esfera abstracta, e isso se confirma pelo fato que o autor em tela alimenta uma espécie de rechaço pelas formas de realidade política, por tanto também por tudo o que é Estado, hierarquia política e imperium, em conformidade com certas concepções espiritualistas cristãs (co mo aparece claro também no “tradicionalista” Leopold Ziegler). É um facto que a Tradição se manifesta em sua plena potência formativa e animadora justamente no domínio da organização político-social, para conferir à mesma um significado e uma legitimação superior. Como um exemplo importante que persistiu até à época moderna se pode indicar o Japão(3).



Podem-se distinguir dois aspectos da Tradição, um referido à metafísica da história e a uma morfologia das civilizações, o segundo a uma internegração “esotérica”, ou seja, de acordo com a dimensão em profundidade do diferente material tradicional.



Sabe-se que o termo tradição vem do latim tradere, ou seja, transmitir. Assim o mesmo tem um conteúdo indeterminado, pelo qual se observa seu uso nos contextos mais variados e profanos. “Tradicionalismo” pode significar conformismo, e acerca disso Cherterton disse que a tradição é a “democracia dos mortos”, assim como na democracia a maioria se conforma à opinião de uma maioria de contemporâneos, do mesmo modo acontece no tradicionalismo conformista o qual segue a da maioria daqueles que viveram antes de nós. Quiçá poucos saibam que o termo Kabbala tem literalmente o sentido de tradição, mas aqui é em relação com a transmissão de um conhecimento metafísico e da internegração “esotérica” da correspondente tradição, pelo qual nos aproximamos acerca daquilo do que é a Tradição.



No que se refere ao domínio histórico, a Tradição vincula-se àquilo que poderia denominar-se como uma transcendência imanente. Trata-se de uma ideia recorrente de que uma força do alto actuou em uma ou outra área ou em um ou outro ciclo histórico, de modo que valores espirituais e supraindividuais constituíram o eixo e o supremo ponto de referência para a organização geral, a formação e a justificação de toda realidade e actividade subordinada e simplesmente humana. Esta força do alto é uma presença que se transmite, e esta transmissão de dita força, que se encontra por cima das meras contingências históricas, constituía justamente a Tradição. Normalmente a Tradição tomada neste sentido é levada por quem se encontra no vértice das correspondentes hierarquias, ou por uma elite, e em suas formas mais originárias e completas não há um separação entre o poder temporal e autoridade espiritual(4), sendo a segunda, em matéria de princípios, o fundamento, a legitimação e o crisma da primeira. Como exemplo característico se pode citar a concepção extremo-oriental do soberano como “terceira força entre o céu e a terra”, concepção que se reencontra na realeza nipónica cuja tradição persiste até hoje.



No aspecto aqui indicado de uma “transcendência imanente”, o tradere, a transmissão se refere não a algo abstracto e contemplativo, mas a uma energia que por ser invisível não é menos real. Aos chefes e a uma elite cabe a tarefa de transmissão dentro de determinados marcos institucionais, variáveis, mas homologáveis em sua finalidade. É bastante evidente que a mesma está mais garantida se pode ser paralela a uma continuidade de estirpe ou sangue tutelada por normas rigorosas. De facto, quando a cadeia de transmissão se interrompe, é sumamente difícil restabelecê-la. Nesta perspectiva a Tradição é a antítese de tudo o que é democracia, igualitarismo, primazia da sociedade sobre o Estado, poder que vem de baixo e coisas similares.



Para o segundo aspecto da Tradição, é necessário remeter-se ao plano doutrinário, e aqui o ponto de referência e o que pode denominar-se a unidade transcendente e oculta das diferenças tradições(5). Pode tratar-se de tradições de tipo religioso, mas também de outro género, tais como sapiênciais ou de mistérios. Aquilo que foi chamado de “método tradicional” consiste em descobrir uma unidade ou correspondência essencial de símbolos, de formas, de mitos, de dogmas, de disciplinas, mais além das expressões múltiplas que os correspondentes conteúdos de significado podem assumir nas diferentes tradições históricas. Tal unidade pode resultar a partir de uma penetração em profundidade do diferente material tradicional: indagação — isto deve ser destacado — que deve ser distinta das investigações da denominada ciência comparada das religiões universais, a qual se atém à superfície e tem um carácter empírico e não metafísico. A faculdade requerida, é aquela que se pode denominar como “intuição intelectual ou espiritual”, intuitio intellectualis(6). Só a possessão desta rara capacidade intelectual pode dar o sentido da medida e prevenir o que se poderia denominar a “superstição da Tradição”. Com efeito, há pessoas que se entregam à fantasia e que descobrem em tudo conteúdos tradicionais, ainda quando os mesmos são imaginários ou se trata de contextos espúrios e primitivos. É o análogo do chamado “delírio internegrativo” dos freudianos, os quais querem ver em tudo a acção dos complexos sexuais.



A origem das formas tradicionais é um problema complexo. No que diz respeito ao primeiro dos aspectos aqui aludido, ou seja, o aspecto histórico é muitas vezes formulada a ideia de uma tradição primordial, da qual derivaram as sucessivas e particulares tradições. Mas se permanecemos no plano histórico, este conceito deve ser articulado. A hipótese de uma tradição primordial hiperbórea e nórdico-ocidental no que se refere ao grupo de civilizações tradicionais da área indo-europeia, não se pode fazer demasiado uso no que concerne, por exemplo, às formas tradicionais extremo-orientais, as quais devem remeter-se a um diferente tronco de origem. Mas aqui pode impor-se o ponto de vista a seguir para o segundo aspecto do problema, que é a explicação de concordâncias e de correspondências essenciais de conteúdos tradicionais. É simplista e em parte supersticiosa a ideia de personagens “iniciados” e similares, que nos vários casos operaram conscientemente na origem de toda tradição. Ainda se a ideia quiçá não pode ser aceita por todos sem dificuldade, igualmente muitas vezes se deve pensar em influências(7) por assim dizer, que intervêm na história e nos desenvolvimentos das tradições por detrás dos bastidores, sem que os representantes das mesmas se dêem conta.



Há casos também de um “voltar a brotar” de uma única influência com notáveis distâncias de espaço e tempo, portanto, sem uma transmissão materialmente relevante, quase como um redemoinho que desaparece em um determinado ponto da corrente de um rio para voltar a formar-se em outro ponto. É o que se deve pensar em muitos casos de correspondências tradicionais, em elementos particulares, mas também nas estruturas de conjunto de determinadas civilizações, as linhas de vinculação com a superfície são inexistentes, algo imponderável entra em jogo servindo-se ao máximo de elementos de sustentação. Por exemplo, a génese da antiga romanidade, em tudo aquilo onde esta reproduz formas variadas da tradição primordial indo-europeia, pode ser visto sob este aspecto. Enfim, se deve considerar o caso de que a influência em questão actue sucessivamente, ou seja, no desenvolvimento posterior como tradição de uma matéria originária, transformando-a, enriquecendo-a e também a rectificando. Em certa medida, isto parece ter acontecido na formação da tradição católica a partir da matéria proporcionada pelo cristianismo primitivo.



A introdução da ideia de tradição vale para libertar toda tradição particular de seu isolamento, remetendo o princípio gerador da mesma e de seus conteúdos essenciais a um contexto mais vasto, em termos que são de uma efectiva integração. Para desdenhá-la se encontram tão só eventuais pretensões de exclusivismo sectário(Cool e de privilégio. Reconhecemos que isto pode molestar e criar certa desorientação em quem se sentia muito seguro em uma determinada área restringida. Entretanto, para outros, a concepção tradicional abrirá horizontes, infundindo uma superior segurança, com a condição de não confundir o jogo, como no caso daqueles “tradicionalistas” que colocaram a mão na Tradição só por uma espécie de condimento para a própria tradição particular reafirmada em todas suas limitações e em todo seu exclusivismo.



Notas:



* O texto a seguir escrito por Julius Evola, compõe um capítulo de uma de suas últimas obras “O Arco e a Clava” (1968). O pensador italiano procura explicar a ideia de Tradição desvinculando esta de qualquer forma de tradicionalismo. Para Evola, a Tradição possui um conteúdo meta-histórico e supra-temporal. O autor analisa ainda o chamado método tradicional e o papel das elites na transmissão do conhecimento tradicional.



1. Para Evola a ideia de Tradição é algo mais vasto e universal que o catolicismo. Em sua obra “Os homens e as ruínas” afirma: “Deve, pois permanecer firma a ideia de que ser tradicional e ser católico não é a mesma coisa. Não só isto, por mais que possa parecer paradoxal a alguns, quem é tradicional sendo só católico em sentido corrente e confessional, não é tradicional senão pela metade do caminho. Repetimos: o verdadeiro espírito tradicional é uma categoria muito mais vasta que todo que é simplesmente católico.”



2. Para Guénon, tudo o que é de ordem tradicional tem uma relação com algo que é de origem supra-humana. A Tradição possui uma origem divina e não se confunde com mero costume ou hábito.



3. Para o pensador italiano o Japão era até à II Guerra Mundial um exemplo claro de harmonia entre desenvolvimento técnico e manutenção do espírito tradicional.



4. Segundo Evola, em tempos primordiais, na “Idade de Ouro” não havia a distinção entre poder temporal e autoridade espiritual. O detentor do poder político era também uma autoridade espiritual, a figura da realeza sacerdotal exprime esta ideia.



5. Conceito criado por Frithjof Schuon.



6. Termo usado pela escolástica medieval. A intuição intelectual não se confunde com a intuição sensível e com a razão.



7. Esta ideia de Evola concorda com sua concepção tridimensional da história. Para este autor além das dimensões de superfície, que compreendem as causas, os factos e os dirigentes visíveis, o devir histórico possui também uma dimensão profunda, subterrânea em que agem forças e influências decisivas de origem não humana e que actuam de forma subtil.



8. Característico de todas as formas de tradicionalismos e fundamentalismos.

 http://forumpatria.com/debate-politico-e-ideologico/o-que-e-a-tradicao-por-julius-evola/?PHPSESSID=e3b0pdss728nt0ekn3b3gmjub0

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Como Wall Street financiou a URSS e os Nazistas

Informação maravilhosa. Leia a entrevista de Antony Sutton

http://www.midiaamais.com.br/resenhas/3656-antony-sutton-um-homem-que-pagou-o-preco-da-verdade

Trem-Bala ou "Trem-Mala"?

O Brasil tem uma antiga tradição de superfaturamento de obras públicas e de projetos de reduzida utilidade para a sociedade, cujo objetivo principal parece ser o de proporcionar oportunidades de polpudos ganhos para as partes neles envolvidas. Para não sair do Rio de Janeiro, as primeiras têm um exemplo didático na infraestrutura erguida a toque de caixa (e com poucas licitações e controles) para os Jogos Panamericanos de 2007, e os segundos, na faraônica, desnecessária e inconclusa Cidade da Música. Agora, o candidato a campeão absoluto dessa última modalidade é o Trem de Alta Velocidade, mais conhecido como trem-bala, para efetuar a ligação Rio-São Paulo-Campinas, que o Governo Federal pretende licitar ainda este ano, entregando-o como um fato consumado ao sucessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Trata-se de um projeto monumental sob todos os aspectos. O traçado entre o Rio e Campinas, com escalas em Barra Mansa (ou Volta Redonda), Aparecida, São José dos Campos e São Paulo, terá 511 km, para um tempo total de viagem de pouco menos de duas horas e meia. Devido às especificações técnicas necessárias para o tráfego das composições capazes de superar os 300 km/h, terão que ser construídos 108 km de pontes e viadutos e 91 km de túneis, dispendiosas obras de arte que representam quase 40% do traçado.

O custo estimado do megaprojeto é de R$ 33 bilhões, de longe o mais caro do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), a menina dos olhos do presidente Lula. Deste montante, o vencedor da licitação poderá pleitear 60% do valor em financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), quase R$ 20 bilhões. Além disto, o empreendimento deverá ter uma participação pública direta no valor de R$ 3,4 bilhões, sendo R$ 2,3 bilhões destinados às necessárias desapropriações. Como se pode imaginar, sem tais recursos públicos o projeto não sairá do papel.

Mas o grande problema não se refere aos aspectos técnicos ou até mesmo ao custo em si próprio, pois este se justificaria se se tratasse de um projeto de grande necessidade para o País – a questão é que está muito longe de ser.

Segundo os dados oficiais, o projeto foi concebido para atender a uma demanda anual estimada em cerca de 11 milhões de passageiros em 2014, dos quais se prevê que o supertrem poderá arrebanhar cerca de 53%. Para referência, em 2007, a Ponte Aérea transportou cerca de 4 milhões de passageiros e, em 2009, os ônibus transportaram 1,5 milhão de pessoas entre o Rio e São Paulo. Arredondando, consideremos que aviões e ônibus transportem atualmente 6 milhões de pessoas entre as duas cidades a cada ano; para justificar os indicadores "oficiais", seria preciso que esse número duplicasse em poucos anos, algo que não parece fácil de ocorrer.

Para evitar prejuízos para o futuro concessionário da linha, o contrato de empréstimo do BNDES incluirá uma cláusula que prevê eventuais reduções dos juros, no quinto e no décimo dos 30 anos de prazo do mesmo, caso a movimentação de passageiros fique abaixo do esperado. Porém, a menos que a demanda "oficial" tenha sido bastante superestimada, não é preciso ser especialista em transportes para se antecipar que por um bom tempo não haverá passageiros suficientes para justificar o supertrem, ainda mais com o preço das passagens rivalizando com ou até superando as aéreas (que poderiam ser ainda mais reduzidas com um entendimento entre as empresas aéreas no sentido de retomar de uma forma atualizada o formato integrado da antiga Ponte Aérea). Assim sendo, uma pergunta precisa ser adequadamente respondida: por que essa urgência em construí-lo?

Evidentemente, ninguém pode ser contra a expansão da malha ferroviária, muito ao contrário, já que o Brasil é o único país de dimensões continentais que despreza os trens: os EUA têm 226.000 km de ferrovias; a Rússia, 128.000 km; a China, 86.000 km; o Canadá, 57.000 km; a Índia, 63.000 km; o Brasil não chega a 30.000 km, dos quais apenas a terça parte encontra-se em uso regular.

Esse descaso histórico é ainda mais agravado pelo fato de o território brasileiro dispor de condições extremamente favoráveis às ferrovias, com um relevo pouco acidentado, predominantemente constituído por planícies e planaltos, sendo 97% situado abaixo de 900 m de altitude (57% entre 200-900 m e os restantes 40% abaixo de 200 m).

E, como se sabe, o transporte ferroviário de cargas a distâncias superiores a 400-500 km costuma ser de três a cinco vezes mais barato que o rodoviário, que responde por quase dois terços da movimentação de cargas no Brasil. Esta dependência tem um elevado preço no consumo de derivados de petróleo e altos custos de fretes, acrescidos dos prejuízos decorrentes de acidentes e desgaste dos veículos nas precariamente conservadas rodovias nacionais.

Não obstante, e principalmente quando recursos públicos estiverem envolvidos, a seleção de projetos de infraestrutura de transportes deveria ser feita levando-se em conta a maximização dos seus benefícios para a economia e a sociedade em geral – e não meramente a das vantagens financeiras para construtores, concessionários e investidores (além dos inevitáveis beneficiários na administração pública).

A propósito, o recurso aos empréstimos do BNDES e outros fundos públicos levanta outra questão: por que eles não têm sido usados em grande escala para financiar projetos de alcance muito maior?

Bem mais relevante para o País seria, por exemplo, completar uma ligação com a costa do Pacífico da América do Sul, que não dispõe de uma única ferrovia transcontinental. Além de abrir um precioso corredor de integração física do subcontinente, o acesso aos portos do Pacífico proporcionaria ao Brasil uma considerável redução dos custos de suas exportações aos países asiáticos.
Igualmente, os R$ 20 bilhões do BNDES separados para o trem-bala poderiam custear uma considerável – e inadiável – expansão dos metrôs do Rio de Janeiro e São Paulo, sem a qual as duas megalópoles correm o risco de colapsos na circulação urbana, num futuro muito próximo.

Um estudo de 2009 da Fundação Dom Cabral estimou que, até 2015, as duas cidades poderão atingir um estágio de congestionamentos contínuos no horário comercial, praticamente inviabilizando as suas malhas urbanas. O estudo demonstrou que os paulistanos perdem em média três horas e os cariocas, duas horas diárias em engarrafamentos de trânsito. Os prejuízos anuais causados pelos congestionamentos, em horas de trabalho perdidas, combustível desperdiçado, poluição adicional, problemas de saúde e outros impactos, foram estimados em R$ 31 bilhões para São Paulo e a metade para o Rio. Embora tais custos jamais sejam considerados pelos tomadores de decisões, está mais que na hora de se começar a levá-los em conta.

A Linha 3 do metrô carioca é um exemplo clássico de prioridade relegada a segundo (ou terceiro) plano pelo descaso de autoridades públicas e lideranças políticas com o bem comum, que deveria ser a orientação fundamental das políticas públicas. Com um traçado de 36 km entre Guaxindiba (distrito de São Gonçalo limítrofe com Itaboraí) e a estação Carioca da Linha 1, permitiria fazer em cerca de 45 minutos um trajeto que atualmente leva quase duas horas, de automóvel, ônibus ou van, isto quando não ocorrem grandes engarrafamentos na Ponte Rio-Niterói ou em seus acessos. E a sua importância aumenta ainda mais devido ao inevitável aumento da circulação de pessoas no eixo Rio-Niterói-São Gonçalo-Itaboraí, após o início das operações do Complexo Petroquímico de Itaboraí, a partir de 2014. O projeto integral, que inclui um túnel de 5,5 km sob a baía de Guanabara, tem um custo estimado em menos de R$ 4 bilhões, mas a sua construção tem sido sistematicamente protelada com o eterno argumento da falta de recursos.

Vale recordar que o metrô do Rio tem apenas 42 km de linhas, para o transporte de 600 mil passageiros por dia. O de São Paulo tem 66 km, mas, com uma melhor articulação com a rede ferroviária urbana tradicional, transporta cinco vezes mais passageiros. Para comparação, o da Cidade do México, cuja construção foi iniciada na mesma época que os brasileiros, na década de 1970, tem 201 km e atende diariamente a quase 4 milhões de passageiros.

Definitivamente, investimentos como os citados teriam efeitos multiplicadores e benefícios incomparavelmente maiores para a população e a economia que os proporcionados pelo supertrem, que praticamente se limitaria a uma opção adicional para o tráfego de passageiros entre cidades já convenientemente servidas por aviões e ônibus. Portanto, na forma como está sendo apresentado, o projeto do trem-bala está mais para "trem-mala" – uma portentosa mala de lucros para um seleto grupo de privilegiados e uma salgadíssima conta para a cidadania, que, além de financiar boa parte dela com seus impostos, ficaria desprovida dos benefícios de outros empreendimentos realmente prioritários.
O autor é geólogo, diretor do Movimento de Solidariedade Ibero-americana (MSIa) e co-autor do livro A hora das hidrovias: estradas para o futuro do Brasil (Capax Dei, 2008); geraldo@msia.org.br Este endereço de e-mail está protegido contra spambots. Você deve habilitar o JavaScript para visualizá-lo. .

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Ótima análise. Esse negócio de trem-bala pode ser que no futuro possa vir a vingar, mas hoje não há a necessidade para tal e também um custo que justifique esse empreendimento.

sábado, 14 de agosto de 2010

Namoro com o genocídio

Olavo de Carvalho
Zero Hora, 17 de novembro de 2002
 
No artigo anterior, esqueci de mencionar, entre as entidades que resistiram bravamente ao totalitarismo petista no Rio Grande, a Associação dos Oficiais da Brigada Militar. Esqueci, talvez, porque a menção era óbvia demais. Se não fosse pela teimosia de seus oficiais, a Brigada talvez já nem existisse, substituída a esta altura por milícias de arruaceiros doutrinados, bem no feitio daqueles que, sob as bênçãos do governador e de seu secretário da Segurança, demoliram o relógio comemorativo dos 500 anos de Brasil.
"Quem sofreu sob o teu jugo te conhece", dizia Nietzsche -- e, evidentemente, só quem conhece pode ensinar quem não conhece. Daí a obrigação que cabe aos gaúchos, agora que exorcisaram o íncubo petista: mostrar ao resto da população a verdadeira face de um partido totalitário, no qual se depositam hoje as mais insensatas esperanças de um país que disse adeus à realidade.
É verdade que, no conjunto da militância petista, só uma fração é revolucionária, leninista, ditatorial. Mas, definitivamente, não estou entre os que levam muito a sério a distinção de "extremistas" e "moderados", hoje elevada às alturas de um critério último para o prognóstico dos destinos nacionais. Moderação e extremismo, afinal, são apenas noções quantitativas, usadas para graduar alguma qualidade que, esta sim, é essencial, substantiva. Jamais a consideração da mera quantidade pode sobrepor-se, numa análise razoável, ao conhecimento da essência, do quid, da natureza do objeto em questão.
Em primeiro lugar, o movimento comunista, que tem 150 de existência, experiência, conhecimento e prática, sempre teve mão dupla, indo para cá ou para lá, freqüentemente para as duas direções ao mesmo tempo, conforme as conveniências.
A mente treinada na dialética de Hegel e Marx (para não falar das astúcias de Lenin e das sutilezas de Antonio Gramsci) habitua-se a jogar com as contradições não somente no plano teórico, mas no da ação prática, articulando o sim e o não num vai-não-vai estonteante, calculado para desorientar o adversário e induzi-lo à rendição ou ao suicídio. Uma das modalidades preferenciais dessa técnica consiste precisamente em assustar o infeliz com o fantasma do radicalismo para atirá-lo nos braços da alternativa "moderada", de modo que aquilo que antes se evitava como à peste venha a ser aceito como um remédio salvador.
Essa armadilha é tão velha, tão gasta, que chega a ser comovente a ingenuidade patética com que nela vão caindo todas as lideranças empresariais e políticas deste país, soi disant espertíssimas, mas totalmente ignorantes dos principios mais elementares da estratégia comunista.
Em segundo lugar, colocar a opção entre petismo moderado e petismo radical no centro do debate nacional é simplesmente dar o último e decisivo passo para a total esquerdização da vida política no Brasil, com a conseqüente supressão de todas as oposições "de direita".
Quantas vezes será preciso explicar que não se leva um país ao comunismo por meio da propaganda direta, simples e unívoca, e sim através da inteligente manipulação dos conflitos por meio do que Lênin chamava "estratégia das tesouras"? Não se trata de impor uma doutrina partidária explícita, mas de fazer com que um fundo de esquerdismo geral e difuso prevaleça em todos os partidos, inclusive os mais alheios a qualquer cumplicidade consciente com a esquerda. Quem observe a curva da evolução política do Brasil nos últimos vinte anos notará que, gradativamente, a dose de direitismo permitido foi diminuindo, diminuindo, até que, nas últimas eleições, a escolha do cidadão foi restringida a um mostruário de esquerdismos diversos. Na realidade, nem tão diversos: os partidos de Ciro Gomes e Garotinho são membros do Foro de São Paulo (coordenação geral do movimento comunista no continente), comprometidos ao menos informalmente a colaborar para a eleição de Lula, que essa entidade sempre considerou prioritária. A presença desses senhores no pleito -- cinicamente alardeado como "o mais transparente de toda a nossa história" -- funcionou apenas como excipiente inócuo para a substância petista que se pretendia injetar no eleitorado. Não é de espantar que ambos já tenham seu lugar prometido no novo governo. O terceiro e principal partido concorrente, o PSDB, mal terminadas as apurações já anunciava sua intenção de mover ao novo governo tão-somente uma "oposição light", ficando, portanto, tudo em família. Mas, como todas as atenções nacionais tendem inevitavelmente a concentrar-se na alternativa entre dois petismos, o bonzinho e o malvadinho, que outra função terá nesse quadro o pobre PSDB senão o de uma força auxiliar do petismo moderado, função aliás já assumida, com humildade servil, também por todos os demais partidos? O PT, portanto, já ocupa todo o cenário político, sem deixar espaço para outra oposição que não sua própria oposição interna, vendendo como democracia o bom e velho "centralismo democrático" leninista. Quem quer que tenha estudado Lênin reconhece nesse processo a aplicação literal da "estratégia das tesouras", coroada de sucesso fulminante graças à estupidez pomposa de tantas lideranças ilusoriamente antipetistas. Não é preciso dizer que, precisamente nesse ponto, os gaúchos foram a exceção honrosa, porque só no Rio Grande houve oposição efetiva, graças não só à coragem daquelas entidades combatentes mas à lucidez de tantos estudiosos e analistas políticos, entre os quais me ocorrem agora especialmente, sem demérito de quaisquer outros, os nomes de Denis Rosenfield, José Giusti Tavares, Adolpho João de Paula Couto e Percival Puggina.
Em terceiro lugar, é uma deplorável burrice confundir o discurso moderado com a moderação das ações. Afinal, Stalin começou sua carreira de governante, justamente, esmigalhando a ala extremista do Partido Comunista russo. E quem assinou em dezembro de 2001 o manifesto de solidariedade às Farc na reunião do Foro de São Paulo em Havana não foi nenhum "radical do PT", e sim Luís Inácio da Silva em pessoa -- a moderação encarnada. Quando um homem como o sr. Antonio Palocci é festejado nos meios empresariais graças ao poder encantatório do seu comedimento discursivo, todo mundo esquece que ele é um propagandista das Farc, cúmplice ideológico da morte de mais de 30 mil vítimas da narcoguerrilha colombiana. Num momento em que agentes das Farc estão reconhecidamente infiltrados nas quadrilhas nacionais de narcotraficantes, treinando bandidos para elevar o grau de violência nas nossas ruas até o absolutamente insuportável, prever a conduta de políticos esquerdistas mais pela moderação da sua fala do que pela periculosidade das suas alianças é mais que suicídio: é um namoro com o genocídio.

Espada da Cristandade na Albânia: Jorge Castriota 'Skanderbeg' (I)

Espada da Cristandade na Albânia: Jorge Castriota 'Skanderbeg' (I)
Posted: 11 Aug 2010 10:25 AM PDT
Skanderbeg , heroi católico albanes na luta contra os turcos
Príncipe da Albânia, cognominado pelo Papa Calixto III de atleta de Cristo, "durante vinte e quatro anos inteiros opôs vitoriosa resistência aos exércitos turcos, com freqüência 10 a 20 vezes mais numerosos que o seu".(1)

Jorge era o mais novo dos filhos do Príncipe João Castriota, senhor de Ematie, na Albânia, e da Princesa sérvia Voizava, tendo nascido no ano de 1414.

Quando, em 1423, o sultão turco Amurath II invadiu a Albânia, o Príncipe João, para salvar o reino, não podendo pagar a vultosa soma que lhe era exigida como dano de guerra, precisou dar como reféns ao vencedor seus quatro filhos, Estanislau, Reposio, Constantino e Jorge.

Dos quatro, dois morreriam envenenados; um terceiro, retornando à Albânia, entraria num mosteiro; e somente o caçula, Jorge, tornar-se-ia um grande guerreiro.

Chegados à Turquia, os três mais velhos foram postos no calabouço, pois não estavam dispostos a renunciar à sua fé. Como Jorge tinha apenas nove anos e era de muito boa presença, foi circuncidado e educado no islamismo. Mas, em segredo, guardou a fé de seus pais.

Tanta era a estima que tinha por ele o sultão, devido às suas inatas qualidades, que fez com que lhe ensinassem o árabe, o turco, o eslavo e o italiano, além do exercício das armas.

Skanderbeg, um novo Alexandre Magno

Aos 18 anos foi nomeado sandiak. Posto à frente de um exército de cinco mil ginetes, passou para a Ásia, onde demonstrou um valor extraordinário. Foi aí que recebeu dos turcos o sobrenome de Iskander-bei (príncipe ou chefe Alexandre, em alusão a Alexandre o Magno), que os albaneses mudaram para Skanderbeg.

Skanderbeg, George Castriota, museo de Kruja, cruzado e salvador da identidade nacional albanes"Dele se diz que era de aspecto majestoso, e dotado de uma força fora do comum. [...] Conta-se que, durante um combate, logrou com um só golpe cortar em dois um guerreiro protegido com couraça".(2)

"Todos os contemporâneos o elogiam como um dos mais belos e esforçados caracteres varonis daquele século. [...] Sua afeição aos combates era tão grande, que o dar uma batalha de quando em quando constituía para ele uma necessidade. Nele se juntavam o valor do soldado e o olhar penetrante do general; suas forças corporais apenas podiam esgotar-se com esforços, e a rapidez de seus movimentos militares trazia à memória os de César".(3)

Entretanto, Skanderbeg não se esquecia de seu país e procurava uma ocasião para a ele retornar. Em 1432, com a morte de seu pai, deveria herdar suas possessões. Mas o sultão, em vez de lhe dar o território que lhe competia por herança, quis tê-lo para si. E enquanto mandava um dos seus chefes tomar conta dele, mandou Skanderbeg invadir a Sérvia.

Jorge aproveitou-se do momento imediatamente precedente à batalha para passar para o lado sérvio. Antes, porém, tinha forçado o secretário de Estado do sultão a entregar-lhe uma ordem, dirigida ao comandante de Kruja, na Albânia, para que reconhecesse o portador como seu sucessor no comando daquela praça e lha entregasse.

Líder das tropas albanesas, cruzado contra os otomanos

Depois da batalha, vencida pelos cristãos sérvios, Skanderbeg refugiou-se nas montanhas, com 600 cristãos fugidos das tropas turcas e mais alguns montanheses. Tendo entrado em Kruja, onde recebeu o comando da praça, à noite abriu as portas para seus partidários, que aniquilaram a guarnição turca. Skanderbeg chamou depois todos os seus parentes e albaneses a Kruja, para tomarem parte na libertação de seu país.

A insurreição se alastrou com tal rapidez, que em pouco tempo Skanderbeg havia tomado as principais praças da região.

Convocou então uma reunião em Alessio, em território veneziano, da qual participaram albaneses e venezianos, sendo eleito indiscutível chefe, aclamado por todos.

Nossa Senhora do Bom Conselho de Scutari, Skanderbeg foi grande devoto delaNossa Senhora do Bom Conselho de Scutari, Skanderbeg foi grande devoto dela

Posto à frente de sete mil infantes e oito mil cavaleiros, Skanderbeg enfrentou e derrotou em 1444 um exército turco de 40 mil homens, comandado por Ali Pachá.

Skanderbeg procurou unir-se com a Hungria e a Transilvânia na luta contra os otomanos, e aderiu ao plano de Cruzada proposto pelo Papa Eugênio IV.

No ano de 1448, Skanderbeg derrotou mais uma vez os turcos comandados pelo paxá Mustafá, fazendo-o prisioneiro como a outros de seus oficiais, por cuja liberdade exigiu vultosa soma.

(Fonte: José Maria dos Santos, "Catolicismo", abril de 2004)

'Herois medievais'


quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Shinkansen: a história do trem-bala começou aqui


São Paulo - Há 46 anos, no Japão, a primeira linha de trens de alta velocidade no mundo foi inaugurada. Ainda em uso, ela pertence à rede da empresa Shinkansen, na qual circulam os veículos que ficaram conhecidos pelo mesmo nome.
E foi por causa do formato e da velocidade dos Shinkansen que este tipo de veículo recebeu o apelido de trem-bala. O modelo da foto é um Shinkansen da série E5, capaz de atingir 300 km/h.
Desde que a linha inicial foi inaugurada, a rede expandiu e, atualmente, conecta a maior parte das cidades das ilhas de Honshu e Kyushy, as principais do arquipélago. As composições passam com velocidades semelhantes à do E5 por um território habitualmente fustigado por terremotos e tufões.
Shinkansen em Tóquio
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sexta-feira, 6 de agosto de 2010

O valor de um canhão

Artigo de Bóris Fausto, historiador e presidente do Conselho Acadêmico do Gacint (Grupo de Análise da Conjuntura Internacional), da USP. É autor de “A Revolução de 30″ (Companhia das Letras).

O valor de um canhão
Revisão histórica da Guerra do Paraguai afasta influência da Inglaterra no maior conflito bélico da América Latina 

BORIS FAUSTO | COLUNISTA DA FOLHA DE SÃO PAULO

A pedido do vice-presidente do Paraguai, Federico Franco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou a decisão de devolver àquele país o canhão “Cristão”, fabricado pelos paraguaios a partir de sinos de igrejas, no curso da guerra com a Tríplice Aliança, formada pelo Brasil, a Argentina e o Uruguai, entre 1864 e 1870.
A medida foi aplaudida pelo presidente do Clube Militar [general Gilberto Barbosa de Figueiredo], afirmando que “normalmente não se devolve troféu de guerra, mas o povo paraguaio merece; é um ato de grandeza”.
Aplausos, com um pequeno adendo: mais do que um ato de grandeza, a devolução é um ato de justiça.
“Guerra brasileira”
A Guerra do Paraguai foi o fato mais relevante da história latino-americana, na segunda metade do século 19. A luta contra aquele país, liderado por Francisco Solano López, que a princípio reuniu os três países citados, passou a ser, cada vez mais, uma “guerra brasileira”, seja pelos efetivos militares envolvidos, seja por sua repercussão interna.
O episódio tem também muito interesse pelas controvérsias historiográficas que gerou. Até anos recentes, Solano López era considerado, no Paraguai, um herói nacional; no Brasil, foi pintado como um tirano sanguinário, que tivemos de esmagar, apesar de nossa vocação pacifista.
Nem tão herói assim
Essas visões mudaram nos dois lados, pois, se Solano continua a ser um herói da pátria para a maioria do povo paraguaio, vários historiadores daquele país promoveram a revisão para baixo de sua figura. Quanto ao Brasil, a Guerra do Paraguai foi descrita e analisada, por muitas décadas, a partir de uma versão patrioteira.
Qualquer outra versão era considerada impatriótica e implicitamente perigosa. Uma reviravolta ocorreu a partir dos anos 1960 do século passado, no âmbito da voga do nacionalismo anti-imperialista, nos meios intelectuais da América Latina. Um dos pontos centrais da revisão diz respeito às causas da guerra, atribuída às maquinações do imperialismo britânico.
Um livro típico daquela época, “Genocídio Americano – A Guerra do Paraguai”, do jornalista Julio José Chiavenato (1979, ed. Moderna, esgotado), teve imenso sucesso nas escolas brasileiras, incorporando a versão conspirativa.
Segundo o autor, ao destruir o Paraguai, o imperialismo inglês manteve o status quo na América meridional e impediu a ascensão de seu único Estado economicamente livre.
Hoje, a tese conspirativa está desacreditada, graças aos trabalhos de Francisco Doratioto, baseado em fontes brasileiras e paraguaias (“Maldita Guerra”, 2002, Cia. das Letras), e de outros historiadores, como Ricardo Salles ["Guerra do Paraguai - Escravidão e Cidadania na Formação do Exército", Paz e Terra] e Vitor Izecksohn ["O Cerne da Discórdia - A Guerra do Paraguai e o Núcleo Profissional do Exército", E-Papers].
Na verdade, aos ingleses interessava acima de tudo a estabilidade da região, como garantia de seus bons negócios, e não um conflito. É certo, que após estourar a guerra, bancos ingleses financiaram o Brasil, agravando aliás o problema de nossa dívida pública, mas isso é outra história. O conflito teve causas locais, embora nem sempre fáceis de discernir.
Morticínios
De um lado, Solano López, que instaurara no Paraguai uma ditadura férrea e convertera o país numa grande fazenda pertencente ao Estado, pretendia romper o relativo isolamento paraguaio e abrir caminho para uma presença maior na bacia do [rio da] Prata.
De outro lado, as pretensões paraguaias eram tidas como francamente expansionistas e vistas com suspeita pelos países da Tríplice Aliança. Se López não era um herói precursor do anti-imperialismo, o Brasil liberal, mas escravista, não ficava em boa posição na luta contra o ditador.
Além disso, ao longo do conflito, as forças brasileiras perpetraram uma série de morticínios, assim como o saque de Assunção, quando a capital paraguaia foi ocupada, em janeiro de 1869. O que não quer dizer que as ações paraguaias não se caracterizassem também por muitas barbaridades. No terreno dos números, há uma total incerteza quanto às mortes do lado do Paraguai, variando as cifras entre 9% e 69% da população!
O Brasil enviou para a guerra cerca de 139 mil homens, dos quais uns 50 mil morreram nos combates ou foram vítimas de doenças.
Os contingentes incluíram, além do Exército, os “voluntários da pátria” -na verdade, gente enviada à força para a frente de combate, entre eles escravos que substituíram filhos da elite. Para qualificar o conflito numa frase, lembremos uma carta escrita pelo barão de Cotegipe para o barão de Penedo, em maio de 1866. Nela, há um trecho eloquente, lembrado por Doratioto: “Maldita guerra, atrasa-nos meio século!”.
De fato, a guerra não nos atrasou meio século, como pensava o provecto barão, mas certamente mereceu o qualificativo de maldita.

Contatos da al-Qaeda no Brasil

Pela primeira vez o governo dos Estados Unidos classificou como narcoterrorismo o crime pelo qual são acusados três integrantes da al-Qaeda em Mali e com contatos no Brasil.

A detenção realizada por uma operação designada pela Agência Americana de Luta contra o Narcotráfico, a DEA, revelou os vínculos entre a rede terrorista comandada por Osama bin Laden e contrabandistas brasileiros.
 
O jornal Folha de São Paulo publicou uma reportagem onde destaca que, depois das descobertas, a Polícia Federal do Brasil está realizando investigações que permitam identificar as ligações brasileiras com o narcoterrorismo, definido como o tráfico de entorpecentes para financiar o terrorismo.

Conforme destaca o matutino paulista, milicianos da al-Qaeda declararam haver recebido ajuda de contrabandistas brasileiros para transportar entre meia e uma tonelada de cocaína da Colômbia até Mali, na África Ocidental, com a finalidade de vendê-la na Europa.

A suposta conexão brasileira foi revelada por Omar Issa, Harouna Touré e Idris Abdelrahman, os milicianos da al-Qaeda que atuam em Gana, Mali, Argélia e outras regiões da África Ocidental, os quais, após serem detidos, foram deportados para Nova York, onde serão julgados.

Segundo as declarações dos detidos, respaldadas pelos carimbos no passaporte de Touré, que demonstram sua presença no Brasil, França e Arábia Saudita, ele era o contato com os contrabandistas brasileiros.
De acordo com o que a DEA conseguiu descobrir, através de um agente infiltrado que manteve conversações telefônicas e gravou vídeos dos encontros, Touré iria buscar a droga na Colômbia e, com a ajuda de contrabandistas brasileiros, a transportaria até Mali, revela o informe da Folha de São Paulo.
A partir dali, o carregamento de drogas seria transportado pelo deserto até o Marrocos, para ser então levado até a Europa através da Espanha.

A DEA conseguiu desarticular a operação ao infiltrar um agente que se fez passar por membro das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), e que estava disposto a conseguir meia tonelada de cocaína para a al-Qaeda, o que traria um lucro de US$ 1 milhão para o grupo terrorista, segundo revela a Folha.
Os três milicianos da al-Qaeda capturados, e que agora estão detidos em Nova York, pertencem à facção Aqim, que significa “al-Qaeda do Magreb Islâmico”, um grupo que Osama bin Laden autorizara a usar o nome da rede terrorista a partir do ano de 2006.

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