sábado, 8 de maio de 2010

Divisão do Pará: separatismo em debate



Avanço de projeto no Congresso faz movimento pela emancipação do Estado de Carajás reacender debates
Na entrada do município de Marabá, o bar e restaurante Paraense praticamente mantém as portas fechadas, sem clientela. Do outro lado da rua um loteamento habitacional anuncia: ‘estamos plantando a semente do novo estado’. O contraste entre o restaurante que homenageia o Pará e o empreendimento que apregoa o surgimento de um novo estado reflete o sentimento de grande parte da população do sul e sudeste paraense, com a expectativa de que, dessa vez, ocorra o plebiscito sobre a criação de Carajás e, com isso, a tão propalada divisão do Estado seja efetivada.

A reserva de voos a Brasília já está esgotada. E uma caravana com pelo menos dez ônibus deve sair de Marabá e municípios próximos, assim que for definido o dia de votação no Congresso para aprovar ou não o plebiscito para discutir a criação dos estados de Carajás e Tapajós. “Muita gente, muito empresário, muito político, todos que estão interessados irão”, diz o empresário Caetano Reis.

Em Marabá e Parauapebas, os dois principais municípios da região, o discurso é quase o mesmo: as dimensões continentais do estado inviabilizam a administração. “É questão de dias. Está provado que o estado do tamanho que está é ineficiente”, diz em Parauapebas o vereador Odilon Rocha, do PMDB. “O trem nos aproxima mais de São Luís do que de Belém”, complementa.

O exemplo que todos miram está próximo. É o estado de Tocantins. “Se dizia que não dava nada ali e hoje melhorou. Por isso acreditamos que é uma separação que soma”, afirma. Odilon Rocha é maranhense. Veio para ser garimpeiro em Serra Pelada, em 1980. Tirou um pouco de ouro e migrou para o comércio.

MIGRANTES
É uma história que se espelha em diversas outras na região. A do migrante que vem para o sul ou sudeste do Pará e acaba por encontrar um norte na vida. “Aqui o pessoal de outros estados representa uns 90% da população”, diz o presidente da Câmara dos Vereadores de Parauapebas, Adelson Fernandes, ele mesmo um maranhense que chegou ao Pará com seis anos de idade, acompanhando o pai que veio para conseguir um lote de assentamento.

Fernandes acredita que a divisão do estado será benéfica para todos. “A vantagem seria para o Brasil inteiro. Teríamos estados mais compactos, com o povo mais próximo do governo. Teremos mais senadores, mais deputados federais e isso geraria maior representatividade. Para nós que nos sentimos abandonados e rejeitados, seria uma solução”, diz.

O sentimento de abandono é um dos três pilares sustentados pelos defensores da divisão do estado. Segundo José Soares de Moura e Silva, secretário geral do Comitê Brandão, o mais organizado grupo que luta pela criação do novo estado, a exploração predatória da região, a imensidão territorial e a ausência do estado, são os três principais motivos que justificaram a luta pela ‘secessão’ paraense. “Essa situação ingovernável do Pará prejudica a todo mundo”, diz ele.

A casa de Soares é quase um QG da luta pela criação de Carajás. Lá estão arquivados todos os documentos que iniciaram a discussão sobre a divisão do estado. Na parede, a bandeira defendida pelo comitê para representar o novo membro da federação. “Precisamos de políticas voltadas para a região, mas entendemos que a criação do novo estado não pode inviabilizar o Pará. Queremos uma parceria com Tapajós e Pará, que será nosso estado-mãe”, pondera Soares.
Projeto será votado em cinco sessões

A ideia de separação do Pará povoa o imaginário em Marabá há muitos anos. O primeiro estudo a esse respeito foi feito pelo professor José Brandão, que hoje dá nome ao comitê que mais defende a criação de Carajás. Em 1988 Brandão publicou o resultado de cinco anos de pesquisa num jornal de Marabá. A notícia repercutiu. Um ano depois o deputado Asdrúbal Bentes apresentou o primeiro projeto legislativo propondo um plebiscito para a criação do novo estado. “Surgiram as primeiras idéias de nome, como Itacaiunas, Araguaia e Carajás. Ganhou o último”, diz o professor Miguel Costa, um ardoroso defensor da divisão do estado.

O projeto de Bentes tramitou em todas as instâncias e teve como relator o deputado Juarez Marques Batista, mas como Asdrúbal não se reelegeu, o projeto parou, só sendo retomado em 1992, por intermédio do deputado Giovani Queiroz, propondo o plebiscito para a criação do estado de Carajás. O projeto também tramitou em todas as comissões e no dia 4 de abril de 1995 foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça. “Ficou pronto para a votação que nunca se realizou”, lembra Soares.

Em 2004, o então deputado José Roberto Arruda voltou a carga para que fossem criados novos estados. No projeto de Arruda, atualmente cassado, deveriam ser criados nada menos que dez novos estados brasileiros. Só na região Norte seriam três no Pará e cinco no Amazonas. “O projeto tramitou, foi aprovado e ficou pronto para ser votado, o que também nunca ocorreu”, diz José Soares. Com a eleição de Arruda para o governo, o projeto parou.

Em março de 2007, o senador Leomar Quintanilha, do PMDB (TO), protocolou no Senado Federal um projeto propondo a realização do plebiscito para a criação do estado de Carajás. De março a julho de 2007, o projeto tramitou em todas as comissões. “Só não foi aprovado naquele momento porque o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) pediu vistas do processo e segurou o projeto por um ano”, afirma Miguel Costa.

NOVO FÔLEGO

O projeto só foi aprovado no plenário do Senado em dezembro de 2009. Depois foi para a Câmara para ser referendado como projeto de decreto legislativo de 2009, acompanhado de requerimento de ‘urgência urgentíssima’, que foi aprovado no dia 14 de abril. “Essa tem sido agora a nossa maior esperança de vitória”, diz Soares. O projeto tem cinco sessões para ser aprovado. Caso não seja votado, tranca a pauta, ou seja, nada se vota antes dele, a partir daí. “Foi feito um acordo com as lideranças do PT, PSDB e de outros partidos para que plebiscito não ocorra num ano eleitoral”, diz Costa. O projeto agora precisa de dois terços da Câmara para que o plebiscito seja aprovado. A expectativa é que até o final de maio deva ser votado.
(Diário do Pará)

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