sábado, 9 de abril de 2011

Primórdios do Protestantismo em São Paulo

No dia 25 de janeiro de 2004 transcorreu o 450º aniversário da cidade de São Paulo. A fundação de São Paulo coincidiu com a época da Reforma Protestante e da Contra-Reforma na Europa. Em 1554 João Calvino ainda vivia (morreria dez anos depois) e o Concílio de Trento já havia realizado duas de suas três séries de sessões. Os fundadores do colégio de Piratininga, os frades jesuítas Manoel da Nóbrega, José de Anchieta e outros, pertenciam a uma ordem religiosa fundada recentemente que tinha como um de seus principais objetivos combater o protestantismo, como fiel servidora do papa.



Assim sendo, foi praticamente nula a presença de protestantes em terras paulistas no período colonial. Houve apenas a visita de alguns indivíduos isolados, como o fervoroso soldado luterano Hans Staden, que no início da década de 1550 esteve em São Vicente e Bertioga e quase foi devorado pelos índios tupinambás. Outro desses raros visitantes protestantes foi o calvinista Jean Jacques Le Balleur, que havia estado por pouco tempo na França Antártica, uma colônia fundada na baía da Guanabara por Nicolas Durand de Villegaignon. Condenado à morte com outros companheiros pelo líder da colônia (1558), Le Balleur fugiu para São Vicente, onde começou a divulgar a sua fé. Versado em espanhol, latim, grego e hebraico, entrou em debate com os jesuítas. O padre Luiz de Grã foi de Piratininga para São Vicente e fez com que o calvinista fosse levado preso para Salvador, durante o governo de Mem de Sá. Em 1567, após oito anos no cárcere, Le Balleur foi trazido para o Rio de Janeiro e enforcado como herege, na época da expulsão dos últimos franceses.



Foi somente após a independência que os primeiros imigrantes protestantes começaram a fixar-se em território paulista e na cidade de São Paulo. A partir de 1828, chegaram os primeiros alemães, suíços e ingleses, que logo formaram comunidades numerosas e começaram a construir os seus próprios templos. Um personagem conhecido é Júlio Franck, que foi professor do curso anexo da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Ao falecer, em 1841, foi-lhe negado o sepultamento de costume, em virtude de ser protestante. Diante disso, os estudantes o sepultaram no próprio pátio da academia, onde o túmulo se encontra até hoje. Em 1851, junto ao Convento da Luz, foi criado o primeiro cemitério protestante da Paulicéia, depois transferido para o alto da Consolação. Esses imigrantes mantinham as suas atividades religiosas restritas aos seus grupos étnicos, sem qualquer tentativa de pregar a sua fé aos nacionais. Até meados do século 19, não há notícia de um só brasileiro protestante.



O primeiro pregador protestante a visitar a Província de São Paulo foi o pastor metodista norte-americano Daniel Parish Kidder, em 1839. Veio como correspondente da Sociedade Bíblica Americana e manteve contatos com políticos e intelectuais, tais como Rafael Tobias de Aguiar, o padre Feijó e o conselheiro Brotero. Em contato com a Assembléia Provincial, propôs-se a oferecer gratuitamente a cada escola primária da província doze exemplares do Novo Testamento traduzido pelo padre Antônio Pereira de Figueiredo. Devido aos temores do clero, o plano acabou não se concretizando. Dezesseis anos depois, em 1855, o pastor presbiteriano James Cooley Fletcher visitou em caráter particular a capital e o interior paulista. À semelhança de Kidder, manteve contato com homens ilustres e distribuiu as Escrituras. Sendo conhecido do senador Vergueiro, visitou sua fazenda em Ibicaba, onde trabalhavam colonos suíços e alemães.



Coube aos presbiterianos o privilégio de implantar a primeira igreja evangélica de língua portuguesa na terra de Tibiriçá. As primeiras sondagens foram feitas pelos missionários pioneiros Ashbel Green Simonton, Alexander Latimer Blackford e Francis J. C. Schneider, que visitaram a capital paulista entre dezembro de 1860 e fevereiro de 1862. Finalmente, em outubro de 1863, o reverendo Blackford fixou residência em São Paulo, dando início às suas atividades evangelísticas. O primeiro fruto do seu trabalho entre os brasileiros foi, surpreendentemente, um sacerdote – José Manoel da Conceição –, que abraçou a fé evangélica em meados de 1864. Finalmente, no dia 5 de março de 1865 foi organizada a Igreja Presbiteriana de São Paulo, sendo recebidos os seis primeiros membros, quatro portugueses e duas brasileiras. Posteriormente chegaram os metodistas, batistas e outros grupos.



Por ocasião do quarto centenário de São Paulo, o Rev. Miguel Rizzo Júnior, pastor da Igreja Presbiteriana Unida, na rua Helvetia, falou ao jornal A Gazeta (28/01/1954) sobre a presença e contribuição dos protestantes. Após lembrar alguns dos aspectos históricos mencionados acima, o ilustre conferencista apontou vários benefícios trazidos pela obra evangélica. Na área cultural, mencionou as obras didáticas escritas por homens como Antônio Trajano, Eduardo Carlos Pereira, Erasmo Braga e Otoniel Mota, bem como as muitas instituições de ensino, destacando-se entre elas a recém-criada Universidade Mackenzie. Na área social, fez referência às diversas instituições assistenciais que atuavam tanto na capital quanto no interior. Por último, destacou a contribuição mais importante, a influência espiritual, expressando a expectativa de que, no futuro próximo, os reflexos do protestantismo na vida de São Paulo seriam marcantes “na elevação moral do ambiente”.


Nenhum comentário:

Postar um comentário