segunda-feira, 23 de março de 2015

Israel ofereceu ogivas nucleares à África do Sul do apartheid

Israel ofereceu ogivas nucleares ao regime segregacionista sul-africano em 1975, segundo documentos secretos que constituem a primeira prova documental da posse de armas atômicas pelo Estado judeu. 

Minutas das reuniões realizadas por altos dirigentes de ambos os países em 1975 indicam, segundo informa hoje o jornal britânico "The Guardian", que o ministro de Defesa sul-africano, Pieter Willem Botha, solicitou as bombas e seu colega israelense Shimon Peres, hoje presidente de Israel, as ofereceu "em três tamanhos". 

Ambos os políticos assinaram também um amplo acordo que incluía uma cláusula pela qual se declarava secreta a própria existência desse comprometedor documento. 

O documento, descoberto pelo acadêmico americano Sasha Polakow-Suransky enquanto preparava um livro em torno da estreita relação entre os dois países, prova que Israel dispõe do arma atômica apesar de sua política de "ambiguidade" pela qual nem o nega nem o confirma. 

Segundo "The Guardian", as autoridades israelenses tentaram impedir que o Governo sul-africano pós-apartheid desclassificasse o documento a pedido de Polakow-Suransky. 

Essa revelação tem especial importância esta semana na qual as conversas sobre não-proliferação nuclear que se realizam em Nova York se centram na situação do Oriente Médio. 

Também joga por terra a pretensão israelense de se apresentar como um país "responsável" que em nenhum caso abusaria de suas bombas nucleares, ao contrário de outros como o atual Irã. 

Polakow-Suranksy dedicou ao tema um livro intitulado "The Unspoken Alliance: Israel''s secrety alliance with apartheid South África", que será publicado esta semana nos Estados Unidos. 

Segundo o autor, entre as pessoas que participaram daquela reunião no dia 31 de março de 1975 estava o chefe do Estado-Maior sul-africano, o tenente-general RF Armstrong. 

Este elaborou imediatamente um memorando que assinalava os benefícios que representaria para o país a obtenção dos mísseis Jericho armados com ogivas nucleares. 

Pouco mais de duas semanas mais tarde, no dia 4 de junho, Peres e Botha tiveram uma reunião em Zurique na qual se tratou do projeto Jericho. 

As minutas secretas dessa segunda reunião assinalam que "o ministro Botha expressou seu interesse em um número limitado de unidades, sempre e quando estivesse disponível a carga correta". 

E o documento continua: "O ministro Perez explicou que a carga correta estava disponível em três tamanhos. O ministro Botha expressou sua gratidão e disse que pediria conselho". 

Segundo o jornal, a expressão "três tamanhos" se refere supostamente aos três tipos de armas: convencionais, químicas e nucleares. 

Israel não tinha recorrido ao eufemismo, "carga correta" para se referir a armas convencionais e reflete a sensitividade israelense em tudo ao que se relaciona a suas armas nucleares. 

Isso só pode se referir a armas nucleares já que o memorando do tenente-general sul-africano Armstrong deixa perfeitamente claro que a África do Sul estava interessada nos mísseis Jericho só para transportar armas nucleares. 

O acordo não chegou a ser assinado, em parte pelo custo que representava. Além disso, seria necessário a aprovação final do primeiro-ministro israelense, o que não era de todo seguro, escreve "The Guardian". 

A África do Sul chegou a fabricar suas próprias armas atômicas, possivelmente com ajuda israelense, mas a colaboração entre ambos os países em matéria de tecnologia militar se intensificou ao longo dos anos. 

A África do Sul proviu a Israel boa parte do urânio que este país precisava para desenvolver suas armas nucleares. 

Os documentos confirmam a versão do ex-chefe naval sul-africano Dieter Gerhard, preso em 1983 por espionar a favor da União Soviética. 

Após sua libertação, Gerhard disse que existia um acordo entre Israel e África do Sul que consistiu em uma oferta pelo Estado judeu de armar oito mísseis tipo Jericho com "ogivas especiais", termo que, segundo aquele, se referia às nucleares.

http://noticias.terra.com.br/mundo/oriente-medio/israel-ofereceu-ogivas-nucleares-a-africa-do-sul-do-apartheid,c9e978c65940b310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html

Pai do programa nuclear da África do Sul

O físico Louw Alberts, pai do programa nuclear da África do Sul do apartheid, morreu esta semana em Pretória aos 89 anos, informou neste domingo o jornal Sunday Times. 

Alberts revelou de uma forma curiosa e involuntária as ambições nucleares da África do Sul em 1974, quando era vice-presidente do Conselho Sul-Africano de Energia Atômica. 

O físico participava de um encontro com estudantes em um instituto de ensino médio, quando respondeu a um aluno que qualquer país com o conhecimento sobre energia atômica que a África do Sul tinha podia fabricar uma bomba nuclear. 

Para surpresa de Alberts, alguém presente na audiência contou o que ouviu para a imprensa.
O governo desmentiu que a África do Sul quisesse produzir uma bomba, e tanto o primeiro-ministro do país, John Voster, como o ministro da Defesa, Pieter Willem Botha, recriminaram Alberts pela declaração.
No entanto, em 1977 os Estados Unidos e a URSS anunciaram que a África do Sul tinha realizado testes nucleares no país, no deserto do Kalahari. 

O ministro da Informação do regime do apartheid, Connie Mulder, reconheceu então que o governo utilizaria armamento nuclear caso fosse atacado. 

Alberts assumiu em 1984 a direção geral do Ministério de Minas e Assuntos Energéticos. No cargo, aboliu no setor a proibição da expedição de certificados de qualificação de trabalhadores não brancos, o que condenava os negros a ficaram com os piores empregos. 

A medida provocou hostilidade da direitista União de Trabalhadores Mineiros, que se negou a emitir certificados de qualificação para os trabalhadores negros. 

De profundas convicções cristãs, Alberts defendeu com paixão em muitos debates e vários livros o caráter complementar da ciência e da religião. 

Seu envolvimento com grupos ecumênicos liberais fechou as portas para ele da influente Afrikaner Broerbond, irmandade fundada para promover os interesses do povo afrikaner (descendentes dos colonos centro-europeus na África do Sul), da qual pertenceram todos os primeiros-ministros e presidentes do regime racista. 

Alberts também teve um papel importante nas conversas políticas para desmantelar o apartheid.
Em 1991, Mangosuthu Buthelezi, líder do Inkhata, partido da etnia zulu e rival do Congresso Nacional Africano (CNA), de Nelson Mandela, retirou-se da mesa de negociações. 

Alberts pediu emprestado então o avião privado de um amigo e viajou até a província de Kwazulu-Natal para convencer Buthelezi a voltar a negociar. 

Personalidade complexa e contraditória, típica da convulsa história sul-africana, Alberts deixa mulher e quatro filhos.